O Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) expediram recomendação ao Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) que fiscalize a Usina Presidente Vargas, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em Volta Redonda. No documento, os órgãos apontam “omissão do Instituto Estadual do Ambiente (Inea)”.
Segundo o documento, a atuação do Ibama deve ocorrer nos termos do § 3º do art. 17 da Lei Complementar nº 140/2011, com base na interpretação firmada pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4757, que autoriza a atuação supletiva de ente federativo quando houver omissão ou insuficiência na fiscalização ambiental por parte do órgão originalmente competente. O MPF e o MPRJ solicitaram que o Ibama promova fiscalização independente da pendência de licenciamento ambiental estadual, para verificar o cumprimento da legislação ambiental federal e adotar medidas para sanar ou mitigar eventuais danos ambientais. Também foi recomendado que a autarquia considere o histórico de “reiterados descumprimentos de obrigações ambientais por parte da CSN”.
A recomendação, assinada pelo procurador da República Jairo da Silva e pela promotora de Justiça Luana Cruz Cavalcanti de Albuquerque, estabelece ainda que o Ibama adote as medidas administrativas cabíveis em caso de infrações, como lavratura de autos e aplicação de sanções previstas na legislação. O prazo para manifestação sobre o acatamento da recomendação é de 15 dias e o prazo para apresentação de documentação comprobatória das medidas adotadas é de 90 dias.
Descumprimento de acordos – O MPF e o MPRJ apontam, na recomendação, que a CSN opera há décadas sem licenciamento ambiental definitivo, firmando sucessivos Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) com o Inea. A própria Procuradoria Jurídica do Inea, segundo o Parecer Inea/PGE-RD nº 8/2019, manifestou-se contrária à renovação desses acordos, apontando que a empresa não havia cumprido integralmente nenhum dos compromissos anteriores.
Apesar disso, o Inea firmou o TAC Inea nº 7/2018 e, posteriormente, em 2024, um termo aditivo concedendo mais 27 meses para cumprimento das obrigações. A medida contrariou recomendação anterior do MPF, que orientava o Inea a não prorrogar o prazo de vigência do acordo sem o devido requerimento de licenciamento ambiental.
A recomendação do MPF e do MPRJ também destaca que as cláusulas do novo termo de 2024 repetem obrigações já previstas e descumpridas em acordos anteriores, conforme avaliação técnica do Grupo de Apoio Técnico Especializado do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (Gate/MPRJ) e que o Inea desconsiderou parecer interno que alertava para a inaplicabilidade da teoria da imprevisão e recomendava a imposição de sanções mais rigorosas.
O MPF colheu relatos de 1.431 pessoas em Volta Redonda, em 2022, e constatou que mais de 80% da população ouvida sofre com doenças respiratórias crônicas. A recomendação também menciona que duas ações civis públicas tramitam na 1ª Vara Federal de Volta Redonda, tratando da ausência de licenciamento e da responsabilização pelos danos ambientais e à saúde pública.
Histórico do caso – A atuação do MPF e do MPRJ em relação à CSN e à Usina Presidente Vargas remonta a diversos episódios de descumprimento de obrigações ambientais por parte da empresa.
Em 2015, o MPF propôs ação civil pública para suspender as atividades da usina devido à ausência de licença de operação desde 2012 e ao descumprimento de obrigações estabelecidas em TAC firmado com o Inea. A ação também solicitava a compensação por danos ambientais e morais coletivos causados à população de Volta Redonda.
Outro lado – Em nota, a CSN disse que, ao contrário do que foi sugerido na recomendação divulgada pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), a empresa opera em conformidade com a legislação ambiental e tem adotado todas as medidas necessárias para atender ao Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), cuja execução está em fase final.
“Mais de 92% das ações previstas no TAC Inea nº 7/2018 já foram integralmente cumpridas. O atraso na conclusão das ações remanescentes decorreu exclusivamente dos impactos provocados pela pandemia de COVID-19, que àquela época impactaram o fornecimento e a instalação de equipamentos de grande porte, como os precipitadores eletrostáticos das sinterizações – estruturas com mais de 30 metros de altura, fabricadas sob medida em diferentes regiões do Brasil e do exterior, que tiveram a cadeia de fornecimento de seus componentes fortemente afetada pelas restrições sanitárias impostas, conforme atestado em pareceres técnicos e jurídicos independentes, devidamente analisados pelo INEA e pela Procuradoria Geral do Estado do RJ”, alega a empresa.
“Assim, o aditamento do TAC assinado em 2024, não representou qualquer flexibilização de obrigações, mas sim a formalização de prazos e sanções adequadas à complexidade das obras e ao contexto extraordinário da pandemia. Todas as medidas previstas incluíram, além da conclusão das ações pendentes, o pagamento de multas revertidas em projetos ambientais que beneficiarão diretamente a população de Volta Redonda. Cabe destacar ainda que referido aditivo foi aprovado por unanimidade em deliberação da CECA (Comissão Estadual de Controle Ambiental), que é composta por representantes de inúmeras entidades, dentre elas: CREA (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura), UERJ (Universidade do Estado do RJ), ANAMMA (Associação Nacional dos órgãos municipais de Meio Ambiente) e o próprio IBAMA”, acrescenta a companhia.
E prossegue: “Todas as ações remanescentes do aditivo estão em fase final de conclusão e contam com fiscalização contínua do órgão ambiental estadual, INEA, que vistoria constantemente as instalações da Companhia. Somente no último ano, a UPV passou por seis vistorias. Já em 2025, outras 4 vistorias já foram efetuadas, sendo a última realizada por 6 técnicos, nos dias 28, 29 e 30 de abril, quando se pôde novamente constatar o rigoroso cumprimento das obrigações pactuadas no TAC, além da adequação ambiental das operações da Companhia. Também a empresa francesa de auditoria independente, SGS (Société Générale de Surveillance) realiza auditorias trimestrais quanto ao status de cumprimento das obrigações em curso, que são enviados diretamente para o INEA”.
A CSN afirma ainda que, paralelamente à implantação dos equipamentos novos, a empresa realizou “investimentos vultosos na reforma completa dos equipamentos antigos, reduzindo significativamente as suas emissões de modo a manter suas operações em parâmetros adequados à legislação, como pode ser atestado através do robusto sistema de monitoramento online, com dados enviados automaticamente ao INEA e como tem sido observado e manifestado pela população”.
A CSN reforça, ainda, que Volta Redonda “possui uma das mais completas redes de monitoramento da qualidade do ar do país. A estrutura inclui três estações automáticas, cinco estações semiautomáticas e uma estação meteorológica, com dados enviados em tempo real ao Inea e divulgados publicamente em painel eletrônico instalado na Vila Santa Cecília”.
Salienat que, durante todo ano de 2024, por exemplo, o índice de qualidade do ar foi classificado como “bom” em 98,16% do tempo e como “moderado” apenas em 1,78% do tempo. Os novos equipamentos em instalação deverão contribuir para melhorias ainda mais significativas, diz a empresa.
“Por fim, esclarecemos que a Companhia já investiu mais de R$ 1,2 bilhão no cumprimento do TAC e em ações de melhoria nos seus controles ambientais – valor quatro vezes maior que exigência original de R$ 300 milhões – e esse montante irá ultrapassar R$ 1,5 bilhão até a conclusão dos projetos, representando um esforço técnico e financeiro inédito no setor siderúrgico nacional”.
A CSN conclui que permanece à disposição das autoridades para “prestar todos os esclarecimentos necessários e segue trabalhando com total transparência, responsabilidade ambiental e respeito à comunidade da qual faz parte há mais de oito décadas”. (Foto: Arquivo)